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Sou escritora e uso do artifício de escrever para depurar pensamentos e sonhos. Sou uma leitora apaixonada, curto assistir a filmes e séries e ir ao teatro. Tenho dois livros publicados: "A ilha e a menina" e "Livremente Mara".

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Crônica de uma despedida - escrito por Renato Alessandro

É com meus sentimentos embargados e cheia de saudade que posto essa crônica de meu querido amigo Renato. Infelizmente a vida da gente nos obriga às vezes a ficar distantes espacialmente dos nossos amigos. No entanto, estamos sempre pertos. Um próximo ao coração do outro.
Beijos, Rê

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar...

(Andrade, Carlos Drummond de. Poema a um ausente)

Se todos fossem iguais a você, Que maravilha viver (...)

Vinicius de Moraes

Crônica de uma despedida

Renato Alessandro da Silva



Eis que um poeta cá solitário e tristonho vem para despedir-se através de palavras. Aliás, elas são o mais apropriado neste caso. Imagina um poeta a soluçar sem versos? Sofrente, o escriba amolda quiçá qualquer metáfora com o fito de aquietar-lhe o que se chama algures ‘alma’. Mas que estas imagens relutam em vir com o mesmo compasso das letras que, em comum e fundado acordo, ora adiantam-se. É certo que no ofício de versificar tal ritmo vez por outra pode descompassar: o poeta pretende imprimir as estrofes com nitidez e facilidade, as letras saltam rápida e ferozmente, porém sem música, ocas, opacas. Decerto sairá algo do vernáculo.

É o que sinto neste instante. Quero os verbos, os versos. Mas a única poesia que me vem está lá fora, no fim rubro da tarde, no barulho estridente do sino da catedral (há uma catedral em ruínas), no estribilho das crianças que deixam as escolas e de modo atabalhoado passam o semáforo (o automóvel não as percebe, tampouco vê o sorriso).

Antes, nem faz muito, a poética era muito mais evidente: ao fim do horizonte os ipês – que só costumam apresentar seu tingido e nuance às vésperas da primavera – já vicejavam e tingiam alegremente um espaço que pode, a depender do espírito, ser a vida ou a paisagem.

Antes havia sua companhia, sua camaradagem, seu apoio desde as incipientes horas.

Há, porém, a partir do presente, este instante, no qual a ausência é um peso peremptório: seguir! A vida tem dessas malucas ironias: quando estamos prontos, prestes a explodir em verso o que era apenas rima pobre – partimos.

A contemplar o futuro, certamente, haverá um dia em que todos passaremos. Ficará, inelutável, a pretérita convivência, a solidariedade, a lembrança. Farás a falta de um afluente: os rios só são fortes para superar distâncias porque se enraízam em outros e com este apoio ganham corpulência e deságuam no diáfano oceano.

A nigérrima noite já respira (ao fim da qual nos espera o porvir). Silêncio. Sinto-me triste como pétala fora da flor. E com saudade.

Um comentário:

  1. Meu caro amigo Renato Alessandro! Que saudades de você! Por onde você anda será?

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